Nina,
Deixa eu brincar que você está aqui ao meu lado na pracinha da minha cidade. É manhã de domingo, o sol está claro, Venha, vamos tomar sorvete, ainda tenho umas pratinhas no bolso e dá pelo menos para um. Nós o dividiremos calmamente. Eu sei, você gosta de chocolate. É o meu preferido também. Agora vamos nos sentar.
Repara não, mas minha Tocantins é meio modernosa para uma cidadezinha mineira. Aqui os padrões de arquitetura são bastante duvidosos, e os casarões com beleza e história foram destruídos. Só resta um, onde dormiu a cientista franco-polonesa Marie Curie, no anos 20. Espero que não o derrubem. De bonito ficou a Igreja do Rosário, à sua esquerda, que é uma capelinha singela. Lá dentro há imensas colunas de braúna antigas e ornamentos simples. Atrás dela está a prefeitura, mas sobre isso eu prefiro não lhe falar agora, para não perder meu bom humor.
À sua direita está a Igreja Matriz, uma construção horrorosa que o padre vem tentado organizar, mas está gerando muitas discussões. Uns dizem que parece uma fábrica. E parece mesmo. O curioso é que a igreja matriz fica na praça Mesquita. Ela fica no alto, olhe bem. A rua que dá acesso a ela é a rua Getúlio Vargas, ou” rua dos bancos”, como a chamamos por razões que é fácil deduzir. No início do século passado esta rua era chamada de “a rua do footing", esse anglicismo é uma prova cabal de que o povo da minha terra é metido à besta desde os tempos imemoriais. Nos tempos bons de O Pardal a chamávamos de "rua da lama". Pode rir que é meio tragicômico essa mania de apelidar os lugares. Aqui temos a "rua do brejo", a "sapolãndia" e o "beco do quiabo"
Pois bem, agora olhe para o norte, ali bem a sua frente. Pode rir, é a nossa rodoviária, que deveria entrar para o livro dos recordes como a única rodoviária do mundo que menor que o ônibus. Fazer o quê... E ao sul ... bem, ao sul você está vendo que tem umas casas e um morro e mais nada.
Bom , por que sei onde a posição dos pontos cardeais, você se pergunta. É que por ser versado em cultura inútil, sei que as igrejas antigas tinham a porta principal voltadas para o leste. E também porque o prefeito, num prodígio de paisagismo, mandou colocar um piso aqui na praça com o desenho da rosa-dos-ventos. Ela deve ter sido um pirata em outra encarnação. Sei lá. Só sei que ele tem barbicha, cara de mau e faz tudo o que um pirata faz, acintosamente. O fato é que com este desenho no chão ninguém se perde. Todos sabem que ao sul está a casa da Dona Rute, ao norte o mercado do seu Zé Lindolfo e o bar do Mundico, a oeste a Igreja do Rosário e a leste a papelaria e banca de jornais, onde revistas eróticas são fartamente vendidas. È assim a minha cidadezinha. Ela é meio sem eira nem beira. Mas é minha e eu gosto dela.
O que fazer para mudá-la? Eu sei o que fazer, e farei. Mas agora só eu sei o quanto foi bom desfrutar do sorvete e desta manhã ensolarada com você.
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